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Alexandre Gonçalves: “O cristianismo bolsonarista freestyle”

Cristianismo bolsonarista – O bolsonarismo criou o cristianismo freestyle, gestado por uma teologia pseudocristã no seio das igrejas evangélicas. Sei que a sentença é forte, ainda mais vinda de alguém com 28 anos de ministério pastoral. Também parece dogmática e tendente a uma generalização rasa. Não é, e espero explicar o porquê.

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Em meados dos anos 1950, houve uma ascensão de um tipo de teologia adjetivada de “teologia do domínio”. No Brasil, chegou pelos anos 1960, através de missionários americanos como Bob Weiner e Robert McAlister —este último, fundador da Igreja de Nova Vida, que deu origem à Igreja Universal e à Igreja da Graça de Deus, fundadas por ex-discípulos de McAlister (Edir Macedo e R. R. Soares, respectivamente). Eles defendiam que a mensagem da prosperidade, já trazida por esse movimento, deveria chegar ao povo da periferia, visto que a Nova Vida atingia mais a classe média/alta. Juntou-se a essa teologia a teologia do domínio ou triunfalista.

Essas doutrinas, importadas dos Estados Unidos, apenas comprovam minha teoria de que a boa teologia é destilada na Alemanha, envelhecida na Inglaterra, apodrecida nos EUA e consumida no Brasil. É vinagre! Vou explicar.

Sua base teórica é a seguinte: Deus entregou o domínio da Terra para Adão; este pecou e entregou esse domínio ao Diabo. A missão da igreja é tomar o domínio (“Take Dominion”, da expressão de Bob Weiner em seu livro homônimo) das mãos do Diabo a fim de estabelecer (eufemismo de “impor”) o Reino de Deus aqui na Terra. A estratégia? Estabelecer (impor) a cosmovisão cristã (conceito ressuscitado do calvinismo) em todas as áreas de influência, como as artes, a economia e a política. Preciso dizer que isso vilipendia o evangelho de Jesus a tal ponto que o transforma em instrumento de poder em vez de instrumento de serviço e amor ao próximo?

Jesus era a antítese disso. Ao ser inquirido por Pilatos se era ou não o rei dos judeus, ele respondeu: “O meu Reino não é deste mundo” (Jo 18:36). Em outra situação, testemunhava uma discussão entre seus discípulos sobre quem seria o maior do reino de Deus. A resposta de Jesus surpreenderia os que advogam um domínio da cosmovisão cristã sobre todos indistintamente: “Vocês sabem que aqueles que são considerados governantes das nações as dominam, e as pessoas importantes exercem poder sobre elas. Não será assim entre vocês. Pelo contrário, quem quiser tornar-se maior entre vocês deverá ser servo; e quem quiser ser o primeiro deverá ser servo de todos” (Mc 10:42-44).

Nesse cristianismo freestyle, existe o culto às armas, pois elas são o símbolo do poder pela força. E o mais triste é que usam a Bíblia para basear suas sandices. Falam que Pedro empunhava uma espada. De fato, ele usava (Jo 18:10). Entretanto, quando se dispôs a usá-la para defender Jesus, ferindo um soldado do templo (Jo 18:10 c/c Mt 26:51), foi por Jesus exortado: “Guarde a espada! Pois todos os que empunham a espada, pela espada morrerão” (Mt 26:52). Em seguida, Jesus curou aquele soldado do templo (Lc 22:51), contrapondo o evangelho de guerra com o de amor e serviço. Esse cristianismo anátema exalta o iníquo adágio de que “bandido bom é bandido morto”.

Olhemos para Jesus. Na lei do Antigo Testamento, uma mulher ou homem pegos em adultério deveriam ser apedrejados (Dt 22:22-24). Qual foi a resposta de Cristo ao ser perguntado pelos fariseus o que deveriam fazer diante da situação? Pela lei judaica, ela era uma criminosa. Você imagina Jesus dizendo: “Apedrejem essa vagabunda!”? De forma alguma! Ele disse: “(…) quem não tiver pecado, que atire a primeira pedra” (Jo 8:7). Logo em seguida, todos foram saindo e somente restou a mulher. Jesus a indaga: “Mulher, onde estão seus acusadores? Ninguém a condenou? Eu também não a condeno!” (Jo 8:10,11).

Urge mostrarmos as contradições do atual discurso dessa seita “cristã” bolsonarista em relação ao evangelho de Cristo. Comparar o ensino de Jesus com esse discurso atroz é o que temos de mais importante a fazer a fim de que se sejam desmascarados aqueles que usam a Bíblia e os púlpitos das igrejas como palanque para seus projetos de poder.

Enfim, esse cristianismo freestyle bolsonarista é tudo, menos cristianismo.

Por Alexandre Gonçalves, formado em teologia, direito e letras, é pastor da Igreja de Deus há 28 anos

*Texto publicado originalmente pela Folha de S. Paulo

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Este texto é opinativo e não reflete, necessariamente, a opinião do site Brasil Independente.

Por Redação

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