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Opinião: “Arcabouço fiscal: Estado mínimo e derrota da esquerda”

Arcabouço fiscal – O arcabouço fiscal desenhado pelo Ministério da Fazenda em conjunto com o do Planejamento é um avanço sobre o teto de gastos que vigorou desde o governo Temer – há consenso na esquerda quanto a isso. É verdade que era um teto de gastos desmoralizado por Bolsonaro – mas, vá lá, é um avanço. Mas é bem pior que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) de Fernando Henrique Cardoso, sancionada no início do século.

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Nesta terça (16) veio à luz o desenho final do arcabouço apresentado pelo relator da matéria, o deputado bolsonarista-lirista Cláudio Cajado (PP-BA). O relatório tem apoio do governo Lula e o ministro Fernando Haddad prevê que ele será aprovado com ampla margem, o que é avaliação unânime entre analistas do cenário parlamentar.

Li o relatório, debrucei-me sobre ele algumas horas entre ontem e hoje (quarta), conversei com economistas e parlamentares. Há muitas tecnicalidades e “economês-burocratês-legislalês” que dificultam a compreensão e não irei me deter nas minúcias. O fato é que o texto agrava os piores vetores da peça original do governo.

Mas não só isso. Cajado transformou o Capítulo I do projeto (as “Disposições Preliminares”) num verdadeiro manifesto do Estado mínimo.

O que está afirmado neste manifesto é que o Estado (mínimo) brasileiro serve para garantir o pagamento dos juros da dívida pública. O resto é o resto.

O capítulo I original fazia em sua abertura uma declaração de intenções genérica: “Fica instituído regime fiscal sustentável, no âmbito dos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União, para garantir a estabilidade macroeconômica do País e criar as condições adequadas ao crescimento socioeconômico”.

Cajado não mexeu no texto, mas acrescentou dois parágrafos ao artigo 1º que são espantosos por sua crueza:

“§ 2º A política fiscal da União deve ser conduzida de modo a manter a dívida pública em níveis sustentáveis, prevenindo riscos e promovendo medidas de ajuste fiscal em caso de desvios, garantindo a solvência e a sustentabilidade intertemporal das contas públicas.

§ 3º Integram o conjunto de medidas de ajuste a obtenção de resultados fiscais compatíveis com a sustentabilidade da dívida, a adoção de limites ao crescimento da despesa, a aplicação das vedações previstas nos incisos do art. 167-A da Constituição Federal, bem como a recuperação e a gestão de receitas públicas”.

É taxativa a afirmação: a política fiscal do Estado brasileiro existe para “manter a dívida pública em níveis sustentáveis, prevenindo riscos e promovendo medidas de ajuste fiscal em caso de desvios”. Mais claro impossível. A política fiscal (o orçamento do Estado) existe para assegurar que os juros da dívida pública sejam pagos sem sobressaltos, asseguradas todas as medidas necessárias “em caso de desvios” para manter os ricos, que detêm os títulos de governo, tranquilos. Os juros continuarão a ser pagos sem sobressaltos.

No parágrafo 3º reforça-se o compromisso. Todas as medidas de ajuste fiscal existem para garantir “a sustentabilidade da dívida” com “a adoção de limites ao crescimento da despesa” se tal crescimento ameaçar o pagamento dos juros.

Creio que as classes dominantes brasileiras nunca foram tão sinceras. Haverá limitação ao “crescimento das despesas” (leia-se programas sociais, investimentos públicos em geral e pagamento aos trabalhadores e trabalhadoras do Estado) para assegurar aos ricos “a sustentabilidade da dívida” e o pagamento dos juros.

O Estado será mínimo, frágil e será estrangulado para garantir o pagamento dos juros. É isso o que afirma o manifesto, a declaração de princípios do arcabouço fiscal.

O manifesto contido no relatório de Cajado-Lira é uma derrota histórica da esquerda brasileira. Agravada pelo fato de o Planalto ter proibido os parlamentares do PT de apresentarem emendas ao relatório.

Ou seja: o partido que foi a maior construção histórica da esquerda brasileira irá assinar embaixo e será na prática o patrocinador do manifesto pelo Estado mínimo e em defesa da garantia inamovível do pagamento dos juros da dívida. Está assegurado o sono tranquilo de banqueiros, empresários, ricos em geral e segmentos da classe média que enriquecem enquanto o Estado nacional morre exangue.

Por Mauro Lopes, jornalista

*Publicado originalmente na Revista Fórum

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Este texto é opinativo e não reflete, necessariamente, a opinião do site Brasil Independente.

Por Redação

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