Festival de traições no RJ – Os mais desavisados sobre a natureza do jogo político no estado politicamente mais degradado do país, o Rio de Janeiro (PS: Sou carioca nascido na Lapa, tenho “lugar de fala”), ficaram surpresos com as duas facadas desferidas contra Molon e contra Ciro nos últimos dias.
Mas as duas eram favas contadas. Só não sabíamos quando viriam.
A contra Molon obedece a um ritmo certo, pois tem que ser desferida antes das convenções.
A contra Ciro obedece à burrice de Rodrigo Neves, porque ela deveria ter sido desferida por ele depois das convenções.
Vamos primeiro à “surpresa” de Molon.
Molon foi arrastado – vamos ser honestos: contra a vontade dele – novamente para a órbita do PT. Ele mantinha a absurda ilusão de que seria candidato ao Senado pelo PSB, um partido que nunca honrou compromissos com filiados ou aliados.
Mas é claro que, ao colocar seu infiltrado Marcelo Freixo no PSB, Lula tirou do PSB o direito de ficar ao menos com a vaga do Senado. Foi assim com o infiltrado Dino no Maranhão e com o infiltrado Alckmin a nível nacional.
O PSB (histórico) no fim vai ficar rigorosamente sem nada. Não elegerá no Maranhão nem no Rio, não terá sequer candidatos a senadores nestes estados, não terá candidato no Rio Grande do Sul nem em São Paulo e perderá em Pernambuco, já que de fato Lula está apoiando Marília Arraes. Deu PT no PSB. Perda Total. O grupo de Pernambuco será exterminado por Lula e Marília depois das eleições.
Exclusivo: Rodrigo Neves produziu material de campanha ao lado de Molon
Isso não é surpresa alguma. Avisamos sempre. A surpresa é a surpresa de Molon. Ele se declarou “surpreso” com manifesto de “intelectuais” em apoio à candidatura do grande quadro ideológico da política carioca, o “petista” André Siciliano (sim, eu escrevo com S, de Sicília) em nome, é claro, do “combate ao fascismo”. O capo da Sicília foi o grande chefe do departamento de materiais da Assembleia Legislativa do Rio durante o período de seca do PT depois da prisão de Lula. Com o departamento de materiais da Assembleia na mão, André angariou muita gratidão no “partido da boquinha”, como é conhecido o PT no Rio de Janeiro. A mais forte delas de Benedita da Silva, que já vai aparecer adiante.
Agora Molon está surpreso de novo. Marcelo Freixo, vulgo “Fraga”, parça de Picciani, declarou apoio público a Siciliano, o ex presidente das Assembleias de Witzel e Castro. Freixo cobrou que Molon “cumpra acordo” com o PT. Disse Molon ao Globo: “Ele foi recebido de braços abertos. Sinceramente, eu não esperava que tomasse essa atitude”. Sabia sim, Molon. Todo mundo conhece o verdadeiro Freixo no Rio, por isso ele nunca vai ganhar nada majoritário.
Mas a militância do PT, aquela que leva o piano de graça, sem cargo no Departamento de Materiais nem outros dinheiros, aquela que usa vermelho e jura de pé junto que o PT é de esquerda, não quer apoiar o companheiro siciliano. Ele não é cheirosinho. Ele tem a cara do Quaquá, do Picciani, do Cabral. Ela quer Molon.
Isso abriu uma crise no PT do Rio. Batendo boca com militantes no WhatsApp do partido, a deputada Benedita da Silva disse que eles faziam o jogo da direita (GLOSSÁRIO PT “jogo da direita”: não querer votar em quem sustenta a direção do partido financeiramente) ao pedir por Molon. Zangada, saiu do grupo digitando “Vou dar um tempo pra mim! antes que eu me afogue”. Mas essa aí já se afogou há muito tempo. Este novo capítulo da crise do PT do Rio, dividido entre Freixo e Castro, levou Lula a adiantar a viagem dele ao Rio para hoje.
E no PDT?
Lula também tem seus infiltrados no partido. Mas aqui eles não mandam.
Rodrigo Neves precipitou-se e perdeu o timing da esperteza. Tentou projetar amplitude chamando os setores do PT ligados, como ele, ao capo José Dirceu para um ato em apoio a sua candidatura. O ato foi irrelevante e sem praticamente novas declarações de voto. Os petistas que foram só o fizeram porque viram nisso uma oportunidade de enfraquecer a candidatura do PDT à Presidência da República.
Para tentar encher o ato esvaziado, Neves mobilizou sua maquininha política (não vamos nos alongar aqui), mas ainda assim fracassou. A mortadela não foi suficiente para encher o micro auditório da ABI. As fotos mostram claramente mais cadeiras vazias do que cheias, e as duas únicas personagens relevantes do PT a desfilar ali foram Quaquá, aliado de Cláudio Castro que não declarou voto em Neves, e Leonel Brizola Neto, sempre afogado em seu ódio eterno por Carlos Lupi.
Neves foi burro, mas ele não é burro. Ele não acha que Lula vai apoiá-lo, nem que vai rachar o voto do PT. Para acreditar nisso não bastaria ser burro, teria que ser clinicamente comprometido. Neves pode ser muitas coisas, mas certamente não é um demente. O que ele queria mesmo era se projetar como candidato de Lula no Rio. Para isso ele mandou fazer um poster imenso com seu rosto ao lado do de Lula. Eu não sei exatamente o que colocaram na água dele para ele ter tido a ideia de fazer isso agora, mas deve ser muito forte.
Neves é PT, e sempre foi. Só saiu do partido para tentar se livrar do desgaste da Lava Jato, por puro oportunismo eleitoral. Não conseguiu. Não é de formação trabalhista como eram Jorge Roberto Silveira e João Sampaio, os prefeitos pedetistas que mudaram a cara de Niterói. Se formou na juventude petista e é do grupo de Zé Dirceu. Mostrar surpresa com sua atitude agora seria também ridículo de nossa parte. Mas a surpresa não é com sua atitude, mas com sua burrice em tomar essa atitude agora.
Não houve ainda convenção no Rio e agora ninguém mais no partido quer o nome de Neves como candidato a governador. O que é certo hoje é que ele não terá mais o voto nem o trabalho de ninguém. A liderança de Lupi pode reverter o quadro, mas a pergunta que não quer calar é, por que fazer isso?
A candidatura de Neves não cumpre mais papel algum para o partido. Todos sabemos que ele não tem chances de vitória. Sua função era construir seu nome para o futuro e o nome de Ciro para o presente. Já mostrou que não fará isso, muito pelo contrário, está aí para defender os interesses de Lula e enfraquecer Ciro. Já Daciolo não, esse tem voto suficiente para vencer uma majoritária, principalmente de Senador. O interesse real do partido hoje no Rio é a vaga no Senado e três a quatro cadeiras na Câmara Federal. O que nos interessa nacionalmente é palanque para o Ciro e regionalmente ampliar nossa participação no Congresso. A candidatura Neves hoje só serve a ele próprio e a Lula, não aos nossos interesses.
O melhor cenário para o PDT agora é uma aliança com Paes em torno da candidatura de Ciro para presidente, Santa Cruz para governador e Daciolo para o Senado. Neves podia provar que realmente virou trabalhista ajudando a gente a fazer uma bancada grande do Rio na Câmara Federal.
Lupi é um cumpridor de acordos.
Mas acordos são vias de mão dupla, e Neves, parece que não sabe o que é isso.
Por Gustavo Castañon, professor de filosofia da Universidade Federal de Juiz de Fora
—
Este texto é opinativo e não reflete, necessariamente, a opinião do site Brasil Independente.