‘CPI da Covid lavou a alma do Brasil’ – Não falo aqui como líder sindical ou dirigente partidário. Quem vos escreve é o filho da Dona Dirce, Toninho, como ela carinhosamente me chamava. Minha mãe foi uma das mais de 600 mil vidas perdidas nesta tragédia que ainda estamos vivendo.
Dona Dirce, que vencera as amarguras e as perseguições implacáveis da ditadura civil-militar ao lado do meu pai Guarino nos anos de chumbo, foi infectada com o vírus poucos dias após receber a segunda dose da vacina, período insuficiente para protegê-la. Ela se foi em abril, aos 94 anos.
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Nossa família não pôde velar nem mesmo se despedir da nossa matriarca. Tivemos que enterrá-la em caixão lacrado e a distância por causa dos protocolos sanitários. Uma mistura de impotência e tristeza indescritíveis.
Escrevo estas humildes palavras a Vossas Excelências para agradecer. Agradecer por todo o empenho e dedicação na condução da CPI da Covid. O meu saudoso amigo Ulysses Guimarães já dizia que “CPI todo mundo sabe como começa, mas ninguém sabe como termina”.
No início dos trabalhos, a investigação principal era sobre as consequências do negacionismo genocida do governo e o verdadeiro laboratório da morte implantado no Brasil, com o incentivo do presidente Bolsonaro a um suposto tratamento que a ciência já demonstrou que não funciona para a Covid-19.
Graças aos depoimentos, às investigações e às novas denúncias que chegavam, o gravíssimo caso de negligência escancarou que não era só negacionismo, era negociata. Vimos o escândalo da Covaxin elucidar que a corrupção e o desprezo pela vida humana tinham preço: 1 dólar por dose.
A CPI mostrou mais: que um gabinete paralelo havia sido formado para orquestrar a rede de mentiras e o pacto genocida, tudo com financiamento de alguns mecenas da morte. E, nos acréscimos, a comissão ainda foi capaz de comprovar que uma rede de planos de saúde rifou vidas em nome do lucro e de interesses políticos inconfessáveis, transformando seus pacientes em cobaias humanas, num espetáculo de horror que encontra paralelo nos abomináveis experimentos nazistas.
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Os encaminhamentos da Procuradoria Geral da República e do Ministério Público serão cobrados, mas a história será generosa com aqueles que não se deixaram levar pelas benesses palacianas nem por ideologias negacionistas responsáveis por centenas de milhares de mortes – quantos poderiam estar vivos hoje se as vacinas tivessem sido compradas logo que foram oferecidas, se o Ministério da Saúde tivesse feito campanhas pelo distanciamento e pelo uso de máscaras, se houvesse um governo minimamente decente e preocupado em proteger o nosso povo? Minha mãe estaria viva hoje?
Minha profunda e sincera gratidão aos senadores que estiveram na linha de frente da CPI: Omar Aziz, presidente; Randolfe Rodrigues, vice-presidente; Renan Calheiros, relator; além dos demais membros, Alessandro Vieira, Otto Alencar, Tasso Jereissatti, Humberto Costa, Eduardo Braga, Rogério Carvalho, Fabiano Contarato, Jean Paul Prates e, em especial, às brilhantes e corajosas senadoras Simone Tebet, Eliziane Gama, Leila Barros e Zenaide Maia. Também, é preciso agradecer e ressaltar o papel do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, na viabilização dos trabalhos. Esses nomes ficarão registrados para sempre entre os daqueles que lutaram do lado certo dessa história.
Para nós que perdemos um familiar para a pandemia, fica a sensação de que o Parlamento deu voz ao grito sufocado de revolta e às lágrimas não choradas. Ficam também as boas lembranças de Dona Dirce e uma saudade imensurável. Assim como minha mãe, cada uma das mais de 600 mil vítimas do genocídio de Bolsonaro tem nome, uma história e muitos que sentem a sua falta. Em nome deles, todos esses crimes revelados pela CPI não podem ficar impunes.
Por Antonio Neto, líder trabalhista, presidente do Diretório Municipal do PDT de São Paulo e da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB)
Fonte: Estadão
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Este texto é opinativo e não reflete, necessariamente, a opinião do site Brasil Independente.
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