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Antes colocado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) como dono da palavra final em decisões econômicas do governo, o ministro Paulo Guedes (Economia) viu seus interesses contrariados em dois episódios consecutivos na mesma semana.
Medidas na área de combustíveis, determinadas pelo presidente, foram acatadas pelo Ministério da Economia sob o argumento de que havia risco iminente de uma greve dos caminhoneiros. A justificativa é que o impacto da paralisação só não seria mais danoso do que a própria pandemia do novo coronavírus.
Agora, a pasta trabalha para evitar uma guinada na política econômica do governo, o que poderia derrubar a credibilidade do país.
Membros da área econômica afirmam que os próximos 90 dias serão decisivos para avaliar o caminho escolhido pelo Palácio do Planalto. O foco, no momento, será garantir a aprovação das medidas de ajuste fiscal como contrapartida à liberação de uma nova rodada do auxílio emergencial.
A isenção de impostos sobre combustíveis e a indicação do general Joaquim Silva e Luna para o comando da Petrobras, no lugar de Roberto Castello Branco, foram ordenadas por Bolsonaro apesar de posições contrárias do ministro da Economia.
Após os anúncios do presidente, Guedes estabeleceu um período de silêncio. Nos bastidores, mesmo tentando minimizar os atos de Bolsonaro, auxiliares do ministro reconhecem que, em alguma medida, eles provocarão impacto negativo.
A pasta trabalha com dois cenários possíveis. No primeiro, o dano seria restrito à desvalorização das ações da Petrobras por conta da desconfiança gerada pela retirada de um liberal e a indicação de um general ao comando da estatal. Para isso, a turbulência não poderá afetar a pauta econômica de Guedes, com medidas de ajuste nas contas públicas e reformas estruturantes. No dia seguinte ao anúncio de intervenção de Bolsonaro na empresa, a Petrobras desvalorizou quase R$ 30 bilhões na Bolsa.
O segundo cenário, considerado catastrófico, seria uma mudança de rumos da gestão econômica do governo, o que colocaria em risco a agenda liberal de Guedes. A avaliação é que uma ruptura de confiança na política de longo prazo seria muito mais nociva do que a alteração pontual na Petrobras, provocando fuga de investimentos e elevação de juros, inflação e desemprego.
Está prevista para quinta-feira (25) a votação no Senado da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) do Pacto Federativo, que traz gatilhos de ajuste nas contas públicas. O acordo para votação foi fechado como forma de compensar a nova liberação do auxílio emergencial.
Também estão entre as prioridades da equipe econômica a reforma administrativa, que altera regras de entrada, remuneração e progressão no serviço público, e a privatização da Eletrobras, que sofre com a resistência de parlamentares.
Nas palavras de um interlocutor do ministro, a decisão dos investidores em geral não está ligada à cotação das ações da Petrobras na segunda-feira (22), que deve ter uma queda, mas sim em fatores de longo prazo e na solvência do país.
Integrantes do Ministério da Economia argumentam ainda que as ações recentes de Bolsonaro estão dentro das prerrogativas do presidente da República e não ferem a gestão de Guedes.
A isenção de tributos federais sobre o diesel e o gás de cozinha deve gerar um impacto superior a R$ 3 bilhões na arrecadação. Técnicos afirmam que, seguindo a orientação do ministro, esse custo será compensado, em respeito à Lei de Responsabilidade Fiscal.
Entre as opções colocadas na mesa para avaliação e que podem ser usadas para compensar a medida, estão cortes de incentivos tributários para o setor petroquímico, embarcações, aeronaves e automóveis de luxo para pessoas com deficiência física.
Em relação à troca de comando da Petrobras, a avaliação é que a indicação é uma prerrogativa do presidente e do ministro de Minas e Energia. Na formação de governo, porém, a sugestão do nome de Castello Branco foi dada por Guedes.
Membros da pasta avaliam que não houve perda de poder do ministro da Economia porque, além de não estar diretamente vinculado à Petrobras, Guedes tem nomes no comando de diversos órgãos, como Banco Central, BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social), Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil —este último quase foi demitido por Bolsonaro, mas permaneceu no cargo após ofensiva de Guedes.
Em publicação em redes sociais, o ministro Fábio Faria (Comunicações) afirmou que o governo Jair Bolsonaro seguirá na linha liberal.
“O governo jamais irá intervir em preços e acredita no livre mercado. O que existia era uma total falta de afinidade entre o presidente da República e o Castello e a troca foi um fato isolado”, disse.
Em transmissão ao vivo pela internet neste sábado (20), Bolsonaro fez críticas ao atual chefe da Petrobras. Embora tenha afirmado que não houve interferência na estatal, ele sinalizou que ajustes serão feitos na forma de cobrança dos combustíveis.
“Quando há um aumento de combustível, o pessoal aponta e atira para o presidente da República. Isso vai começar a mudar, começou a mudar já. Temos que tirar quem está na frente da Petrobras. E uma curiosidade. Vocês sabiam que desde março do ano passado o presidente da Petrobras está em casa, assim como toda a sua diretoria? Não dá para estar à frente de uma estatal dessa forma. O novo presidente, caso aprovado pelo conselho, espero que seja aprovado, vai dar uma nova dinâmica à Petrobras, sem interferir, interferência zero, mas vai ter transparência e previsibilidade”, disse.
O presidente ainda sinalizou que pode fazer novas trocas em áreas do governo.
“Se a imprensa está preocupada com a troca de ontem, na semana que vem teremos mais”, afirmou.
Fonte: Folha de S. Paulo