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Newton Cannito: “A Guerra Cultural e Civil só interessa a Bolsonaro”

Vivemos hoje uma Guerra Cultural, que só interessa a Bolsonaro e que pode levar o país às portas de uma Guerra Civil, pois destrói a identidade nacional.

Porque interessa a Bolsonaro? Basta ver que ele foi eleito em 2018 pela Guerra Cultural. E hoje, mesmo em meio a imensa crise econômica, ele se sustenta muito na Guerra Cultural. É sua única chance.

Nesse jogo, os artistas da “esquerda lacradora” atuam, sem querer, a favor de Bolsonaro. A cada lacrada esquerdista em show de jovens,  mais uma mãe de família deixa de votar na esquerda.  E a guerra cultural separa o país e empobrece a arte.

Um exemplo entre milhares é o conflito entre Anita e Zé Neto. Para quem não sabe, Zé Neto acusou Anitta e outros esquerdistas de mamarem nas tetas da Lei Rouanet.  Em resposta a essa acusação, os esquerdistas revelaram que Zé Neto também vive de dinheiro público, altos cachês pagos por prefeituras.  Ambos vivem de apoio público, apenas em guichês diferentes.

Isso é um típico exemplo de como é o raciocínio da Guerra Cultural. A direita acusa a esquerda de mamar no governo. A esquerda responde: vocês também mamam!  O curioso é que, ao acusar o outro de fazer algo que ela também faz , a esquerda acaba virando ré confessa.   E como se dissesse: “Eu mamo nas tetas do governo, mas você também mama”. É uma luta suicida que destrói ambos.

O curioso é que os artistas de esquerda poderiam se defender de outro jeito:  apenas explicar que receber dinheiro da Rouanet não é Mamata. Porque Mamata?

Não tem nada de errado o Estado apoiar a arte, a própria população gosta dos shows.  O lazer e a cultura são direitos humanos fundamentais. Além disso, porque um artista que atrai muito público não pode receber um cachê alto? Quem escreveu isso? Tantas profissões as pessoas têm cachês altos, porque artistas não teriam?

Existe alguma corrupção? É possível, então investiguem. Mas não condenem toda a categoria porque tem algum corrupto. Agora os esquerdistas digitais querem fazer uma CPI do Sertanejo.  No entanto , uma CPI decente não é para investigar seu inimigo da Guerra. CPI é para investigar a todos. A CPI não pode ser polarizada. Se for fazer tem que fazer CPI do Financiamento da Arte, em geral. Não apenas do sertanejo.  Ou investiga todos ou ninguém certo?

Temos que ter os princípios claros se quisermos realmente defender a democracia. Sempre vale a pergunta:  ainda estamos jogando limpo ou já estamos apenas querendo perseguir inimigos políticos? Bem, se estamos jogando limpo a CPI tem que ser para todo financiamento da arte. Sou a favor de investigações por definição. Mas no Brasil temos histórico de investigações que destruíram setores inteiros da economia, como o de construção civil.  Se for fazer CPI tem que tomar cuidado para não prejudicar a atividade. Vocês que estão  por aí brincando de Guerra Cultural é bom saber que podem destruir todo o setor da economia criativa com sua vontade de brigar com o sertanejo. Conto isso pois é bom alertar e para exemplificar como acontece: a guerra cultural destrói o sucesso de todos os lados,  é tipo os jacobinos da revolução francesa. E que isso, ao contrário do que você pensa, vai apenas ajudar a eleição do Bolsonaro e fidelizar votos de públicos que nós poderíamos conquistar. Não seria mais fácil apenas dizer que receber dinheiro da Lei Rouanet não é Mamata?

A coisa aquece pois ambos os lados tem fãs. E o fãs é sempre um hater potencial, o ativista da treta de seu ídolo.   A esfera pública vira uma disputa por lacrações, por frases de efeito que deem boas manchetes.  Possivelmente, foi na busca por uma lacração que Zé Neto falou mal da Rouanet e prejudicou sua carreira.  A principal habilidade do artista influencer é saber surfar no mar das falsas polêmicas que distraem o público.  Essa é a função da Guerra Cultural. Os artistas mais famosos são os que melhor surfam no universo das lacrações.

A coisa geralmente degringola para  as ofensas morais, inflamando os fãs e dividindo o povo em culturas opostas que se hostilizam, criando mega gangues digitais de fãs-haters, tribos grandiosas que se hostilizam por questões morais.  E tipo o que era as gangues de antigamente, mas agora em esfera mundial e em todas as faixas etárias. De repente, todos são adolescentes e soltam seu ódio pela ausência de liberdade (conflito típico de adolescentes)  em suas gangues morais digitais.  São gangues grandes em cada lado, que tem cosmovisões cada vez mais distantes.  Aí começa essa loucura de quem quem vota no Bolsonaro gosta de tal tipo de música e quem vota na esquerda outro. Começa a virar uma divisão total e definitiva. A nação , a identidade em comum de nosso povo, está em risco.

Os artistas de ambos os lados decidiram se engajar no conflito. Mas se engajam como soldados rasos, atuando como mero propagandistas das ideologias criadas pelos ideólogos de seus líderes. O artista vira apenas um bom divulgador da ideologia oficial de quem o contrata.  O artista antigamente era formador de opinião. Agora, é quando muito, um divulgador de opinião alheia.   A criação de opinião está concentrada nas mãos de poucos.  A própria seleção dos artistas pelo capital (privado ou público) prioriza os que conseguem ser robôs. Poucos artistas e influencers ainda conseguem exercer o livre pensar.  É uma prática em extinção. E o fim da era do artista exotico e profeta. Agora o artista é apenas um reprodutor da narrativa, alguém que cria variações da mesma matriz dramática para chegar sempre às mesmas conclusões. Antes, existia publicidade no intervalo das novelas, que era uma arte popular fortíssima no Brasil.  Agora o influencer e a própria publicidade. Sua vida é um testemunho do que ele quer vender.

Quando o artista se torna um robô, ele deixa de fazer arte, e começa a fazer apenas propaganda ideológica. A arte é aberta, a propaganda é fechada. A arte sai da bolha, a propaganda forma as bolhas.  Dessa forma,  a arte que deveria ser mediadora dos conflitos (como até recentemente era a arte brasileira), vira apenas a promotora dos conflitos.

O artista perde a capacidade de ver do alto e de relativizar tudo. E vira apenas um robô inconsciente  da Guerra Cultural.  Isso, obviamente, é péssimo para o artista (Zé Neto com certeza, prejudicou sua carreira com isso), para a arte (que vira apenas propaganda inconsciente)   e para o Brasil, que deixa de ter uma arte mediadora.

A polarização na arte é um sintoma de alerta: podemos estar a caminho de uma guerra civil. Uma guerra Civil não acontece apenas porque tal grupo tem apoio militar. Ela acontece quando as pessoas não conseguem mais conversar. Ela começa na cultura.  As pessoas começam a se definir em culturas completamente diferentes e hostis, incapazes de viver em diversidade.  Se não soubermos criar canais de diálogo, isso pode dividir a nação.

Em “Guerra Civil”,  livro de  Hans Magnus Erzberger sobre a Guerra da Iugoslávia, o autor mostra como a guerra cultural dentro da nação antecedeu a Guerra Civil.  Acredito muito no povo brasileiro e, apesar de minha preocupação,  não acho que chegaremos a tanto.  Mas, mesmo se continuarmos como estamos, paralisados nesse conflito, nossa nação morrerá.

Portanto, é disso que essa eleição trata: por fim a Guerra Cultural para que o presidente eleito possa voltar a cuidar da Economia e da gestão. Os artistas têm um papel importante nisso.  Se nem os artistas conseguem criar diálogo, quem criará? Os artistas de todas as linhas têm que se unir para pôr fim a guerra cultural que divide o nosso povo. Quem se habilita?

Por Newton Cannito – Autor e roteirista de séries como Unidade Básica (Globoplay)

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Por Redação

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