Reportagem assinada pelo jornalista Leonardo Sakamoto em UOL
“Óbito também é alta” não foi a única frase chocante que a advogada Bruna Morato, que representa 12 médicos que trabalhavam para a Prevent Senior, ouviu ser usada como verbalização de uma política para encurtar o tempo de internação de pacientes com covid-19 a fim de economizar recursos.
Em seu depoimento à CPI da Covid, ela havia revelado que médicos relatam que a empresa orientava pela redução da quantidade de oxigênio a quem estava internado há cerca de duas semanas, levando doentes à morte e liberando leitos. O plano de saúde tem negado as denúncias e acusa uma armação.
Em entrevista que nos concedeu no UOL News, nesta segunda (11), Morato afirmou que também ouviu de médicos que eram comuns outras justificativas serem usadas em hospitais da rede, como pacientes já serem idosos e terem vivido muito ou que suas famílias não teriam como descobrir o que realmente aconteceu.
“Ouvi muitas vezes a expressão ‘não vale a pena investir’, quando se tratava de pacientes muito idosos. Investir em um tratamento tradicional, que seria a intubação e o acompanhamento desse paciente. ‘Já viveu o suficiente’ foi outra expressão muito triste que ouvi também. Ou ‘a família nunca vai descobrir’. São todas expressões que precisam ser averiguadas”, afirmou Morato.
Ela ressalta que apesar de as frases serem de “uso comum na operadora de saúde”, elas foram cunhadas por um grupo de profissionais e acabaram sendo repetidas por outros. Diz que o conjunto de provas, incluindo mensagens, que demonstram esse comportamento já foi encaminhado às autoridades.
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A advogada defende que é importante analisar a cultura organizacional da Prevent Senior para entender como tudo isso aconteceu.
O plano de saúde adota um modelo vertical, contando com hospitais e laboratórios próprios para a redução de custos. Isso, como foi discutido na CPI, pode gerar um conflito de interesses entre a prática de um hospital e de seus médicos, enfermeiros e técnicos (que tendem a usar todos os recursos disponíveis para salvar a vida de um paciente) e de um plano de saúde (que defende que os custos sejam os menores possíveis).
Prevent foi usada por Bolsonaro para justificar distribuição de cloroquina
No depoimento à CPI da Covid, Bruna Morato apontou que o plano de saúde, acusado de usar seres humanos como cobaias em experimentos não autorizados e de alterar prontuários e atestados de óbitos para retirar a covid-19 como causa, foi uma peça fundamental na política do governo brasileiro para tentar convencer a população a voltar à normalidade mesmo com a mortalidade trazida pela pandemia.
Afinal, o governo defendia que comprimidos de remédios ineficazes para covid-19, como cloroquina, ivermectina e azitromicina protegeriam a todos.
Essa política, segundo Morato, se alinhava a interesses do Ministério da Economia, que precisava de uma justificativa “científica” a fim de evitar o fechamento de atividades e impedir uma retração do PIB e do emprego. Buscou-se, então, construir esses comprimidos inúteis para a doença como um elixir mágico.
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O esquema teria contado com a intermediação do chamado Gabinete Paralelo do Ministério da Saúde, encabeçado por negacionistas como os médicos Nise Yamaguchi, Paolo Zanotto e Anthony Wong. Este último, inclusive, faleceu de covid apesar do uso do “tratamento precoce”. De acordo com as denúncias, teve seu prontuário manipulado pela Prevent Senior para retirar covid como causa.
Bolsonaro e os ministros da Saúde Eduardo Pazuello e Marcelo Queiroga sempre afirmaram que não poderiam ir contra a autonomia dos médicos em receitar hidroxicloroquina e ivermectina. Mas o plano de saúde fez isso por eles. Segundo Bruna Morato, profissionais de saúde eram obrigados a prescrever o “kit covid”. Algumas vezes, a prescrição já chegava pronta de cima.
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