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Opinião: “Só Ciro rompeu com a hegemonia liberal no debate”

“Ciro rompeu com a hegemonia liberal” – Se algo chamou a atenção no debate deste domingo (28) é o absoluto consenso entre todos candidatos em torno da manutenção do programa econômico vigente desde 1994. A única exceção foi Ciro Gomes, portando a bandeira do nacional-desenvolvimentismo, soterrada por décadas de hegemonia liberal.

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Não foi nenhuma surpresa assistir Lula e Bolsonaro protagonizando o espetáculo tragicômico de uma pornochanchada de acusações recíprocas. Sem nenhum conteúdo político, as réplicas e tréplicas entre ambos candidatos giraram em torno dos respectivos casos de corrupção e novas denúncias, fáceis em governos marcados por seu caráter cleptocrático, com anuência e cumplicidade dos dois durante seus mandatos. Cabe relembrar que Lula jamais foi absolvido, e seu processo foi tão somente anulado pela flagrante ingerência imperialista da Lava Jato, o que não apaga a mácula de sua corrupção. Não fosse a incompetência e má-fé dos agentes da CIA, os corruptos ligados aos neoliberalismo paloccista teriam pago pelos seus crimes contra os Trabalhadores do Brasil. Sabemos qual é a pena por corrupção em países socialistas.

Bolsonaro e Lula disputavam a paternidade de esquemas distributivistas friedminanos, ou seja, neoliberais. O atual presidente-palhaço mais uma vez usou a cartada dos precatórios. Repise-se que os precatórios foram uma chantagem imposta pelo sistema financeiro usando como refém a população massacrada por uma pandemia planetária, cujo único remédio (antes da vacina) era ficar em casa, o que é inviável numa economia marcada pela informalidade, sem auxílio financeiro. O discurso do presidente, até pouco tempo queridinho da Faria Lima, foi somente a respeito do espaço fiscal para tanto, de certo modo chancelando a referida chantagem dos banqueiros. Lula sequer comentou a respeito de algo concreto, mantendo-se somente no nível marqueteiro ralo da “picanha com cerveja”.

Quando Ciro abordou o mesmíssimo tema, foi num ângulo totalmente distinto. Chamou a atenção para sua viabilização por meio da extensão do tripé previdenciário. Diferentemente dos chiliques de alguns economistas petucanos nas redes sociais, o que o governo nacionalista fará com essa extensão não impacta o caráter solidário do sistema previdenciário brasileiro – que, como insistimos há anos, implica em planificação parcial do sistema financeiro da previdência complementar, que o PT havia privatizado. Frise-se que, diferentemente do colonialismo trumpista de Bolsonaro ou do paloccismo, este é um programa que visa dar conta da emergência da informalidade em um país destroçado por três décadas de neoliberalismo ininterrupto – a centralidade do PND está na reinserção soberana do Brasil na economia mundial, deslocando o eixo do todo da nação, e não trocando o principal pelo acessório.

De todos os momentos do verdadeiro consenso neoliberal na Band, o mais risível foi quando Lula e o candidato do Novo trocaram afagos na questão ambiental. O paloccista fez genuflexão frente ao altar do imperialismo da OTAN e se orgulhou de ter entregue uma parcela da soberania dos Trabalhadores do Brasil sobre nossa Amazônia para a Alemanha e Noruega – a mesma monarquia petrolífera responsável pelo crime ambiental da Alunorte em Barcarena-PA. Enquanto o candidato do Novo requentava o velho discurso da suposta onipotência dessa entidade transcendental que os charlatães da Faria Lima cultuam sob o nome de “Mercado”, Lula reiterava a defesa de Leonardo Boff da entrega de pedaços do território brasileiro para potências ocidentais.

A recepção do debate agravou ainda mais esse consenso neoliberal. Diversas páginas supostamente progressistas e a grande mídia se apaixonaram por Simone Tebet e divulgaram com entusiasmo suas falas. Embora sua sonolenta passagem pelo Jornal Nacional não tenha deixado nenhuma marca expressiva, no debate soube capitalizar em cima da necessidade de Bolsonaro de aparentar ser anti-sistema. No programa econômico, a candidata evidentemente ligada ao establishment financeiro foi cristalina em defender o atual modelo de submissão do Brasil, por exemplo, ao concordar com as privatizações que estão arruinando a infraestrutura brasileira. Mas, ao reproduzir o discurso hegemônico do bloco comunicacional Globo-Faria Lima, sequestrando a legítima pauta das mulheres, foi ovacionada por diversos influencers pseudo progressistas e pela esquerda hegemônica social-liberal.

Tebet também deu de bandeja para Bolsonaro a posição de anti-sistema – mais uma vez. Quando a queridinha do “doutor Marinho” partiu para o rebento abandonado da Faria Lima, o presidente-palhaço soube dar a volta por cima e se colocar como o “odiado”, por supostamente ter desmanchado os esquemas de corrupção que engordaram cofres de políticos do PMDB nos governos petucanos, desde FHC, passando por Lula-Dilma até Temer. É claro que num debate marcado pela mentira e o marketing imbecilizante, a verdade é um detalhe irrelevante. O clepto parlamentarismo que Bolsonaro implementou nas emendas do relator junto de seu primeiro-ministro, Arthur Lira, é a forma acabada dos “pasta rosa” de FHC e do mensalão de Lula.

Cumpre registrar que a Band deu espaço para uma candidatura totalmente inexpressiva nas intenções de voto como a do Partido Novo, e não estendeu o mesmo convite para outras candidaturas, também inviáveis eleitoralmente como as de Sofia Manzano do PCB ou de Leonardo Péricles da UP. A impressão que passa é que os editores queriam mesmo essa imagem de um consenso liberal.

O único candidato que realmente rompeu com esse consenso foi Ciro Gomes. A despeito dos acenos emotivos de Lula, o candidato nacionalista mostrou como o paloccismo foi o principal promotor da privatização da educação na gestão de mais um FH da USP no MEC, engordando os cofres das uniesquinas, usinas de diplomas inchadas pelos vouchers da Escola de Chicago disfarçados de programas educacionais. Contra a verborragia neoliberal do candidato do Novo, Ciro mostrou como o Brasil gasta pouquíssimo em educação per capita.

Questionado a respeito da ruptura com o paloccismo, Ciro escapou à armadilha emocional de Lula e deixou claro que sua razão é programática: não capitular mais uma vez aos interesses da Faria Lima, que o petucanismo mais uma vez vem defender. O paloccista pouco pode fazer além do manjado discursinho do “foi para o Paris”, desmentido por qualquer mapa eleitoral de 2018.

Como uma profeta, Ciro mais uma vez pregou o Projeto Nacional de Desenvolvimento, defendendo a ruptura do tripé macroeconômico que submete o Brasil. Fez questão de mostrar que Lula praticou os juros mais altos do planeta, para atender os desígnios dos rentistas financistas e que Bolsonaro é a plena continuidade em termos econômicos. Mais do que isso, o atual presidente-palhaço é fruto não só da irresponsabilidade petucana no agosto sangrento de 2018, mas da destruição objetiva do Brasil pelo neoliberalismo das gestões de Lula e Dilma Rousseff. Também da destruição subjetiva de nosso país, esvaziado pelo consumismo, pelo imediatismo eleitoral cretinizante que abandonou qualquer perspectiva de organização dos trabalhadores e pela falta de um projeto que orientasse a Nação.

É temerário na véspera das comemorações de nosso bicentenário de nossa Independência, o primeiro debate entre presidenciáveis tenha sido marcado pelo consenso de um liberalismo que dilacerou nossa soberania. Ciro Gomes foi o pregador solitário contra esse consenso, trazendo uma velha Bandeira, há tanto esquecida e que nos levou tão longe:

O Nacionalismo Brasileiro.

Por Arthur Silva, servidor público do Estado de São Paulo, graduado em Ciências Sociais pela FFLCH/USP, pesquisa Teoria da Dependência e História Brasileira.

Por Redação

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