Polícia investiga estupro em boate no RJ – Matéria do G1 assinada pelos jornalistas Lívia Torres, Bruno Sponchiado e Douglas Lima informa que a Polícia Civil investiga se houve um estupro dentro de uma boate em Cabo Frio, na Região dos Lagos do RJ.
Segundo a denúncia, o estupro foi praticado por dois funcionários do local. A casa noturna, que não poderia funcionar por causa da pandemia, pertence a Diogo Souza da Silveira, capitão da Polícia Militar, e a Filipe Poubel, deputado estadual pelo PSL.
O caso teria acontecido em 8 maio, véspera do Dia das Mães, e a investigação corre em sigilo. Até agora, o deputado não prestou depoimento. Já Diogo disse que foi procurado pela mulher durante a festa, mas que não quis e se afastou dela. Os funcionários acusados de estupro prestaram depoimento e negaram a acusação.
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A mulher que faz a denúncia, e que por segurança não será identificada, conta que saiu do Rio e foi até Cabo Frio passar o final de semana com a família.
No dia, encontrou alguns amigos e foi a uma festa clandestina que acontecia dentro de um restaurante, que também funciona como boate: o Buda Lounge. A entrada, segundo ela, era pela cozinha – e ninguém podia usar o celular.
O funcionamento de boates e espaços de dança estava proibido na cidade por causa das medidas de proteção contra o coronavírus.
Além de Poubel, eleito pelo em 2018 com 27 mil votos, e Capitão Diogo, uma mulher também é sócia do espaço: Ediléia Freire Cecconi.
Ediléia aparece nas redes sociais como vendedora de bolo e pirulitos personalizados.
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Diogo se descreve nas redes sociais como “Capitão Diogo”, oficial da Polícia Militar. Em um vídeo, divulgado em abril desse ano, ele diz que pediu demissão da PM por ter “visto e vivido injustiças”. A PM diz que ele está lotado no 22ºBPM (Maré), em processo de demissão a pedido.
Em 2018, Capitão Diogo foi candidato à Prefeitura de Cabo Frio pelo PSDB e ficou em quarto lugar, com 3,7 mil votos.
Diogo e Poubel são amigos e aparecem em várias fotos juntos dentro da boate em que são sócios. Numa delas, estão juntos com outros políticos, como o deputado federal Carlos Jordy (PSL) e o vereador Gabriel Monteiro (PSD).
O que diz a mulher
A mulher conta que esteve na boate em Cabo Frio, ingeriu bebida alcoólica, ficou inconsciente, e que foi vítima de abuso sexual praticado por dois funcionários do local. Segundo testemunhas, o deputado e o PM estavam na boate no dia.
“Eu misturei, tinha bebido vodca, comecei a beber um drink pronto com energético. Eu bebi várias desses. Mas isso nunca aconteceu comigo de entrar em coma alcoólico e apagar dessa forma, isso nunca tinha acontecido antes”, contou ao RJ2.
Ela afirma que, quando acordou, já estava no segundo andar da boate.
“Eu tinha uma ideia que o segundo andar era tipo uma espécie de área VIP, camarote, algo assim que me chamaram, não lembro realmente como fui parar lá. Lembro quando uma amiga chegou lá em cima tentou me acordar, não consegui e vi um vulto, um deles estava de uniforme, ainda assim continuei apagada.”
Um homem amigo da vítima, que também pediu para não ser identificado, conta que procurou pela mulher e a encontrou jogada em um sofá.
“A gente subiu, até então, nesse espaço estava fechado em obras, e não tinha nenhum tipo de isolamento, segurança ou nada que não deixasse entrar. Subimos e, quando chegamos, era um lance de escada e lembro de ter visto ela jogada no sofá, de perna aberta, desacordada, na frente dela tinha dois caras. Era um lugar muito escuro, que estava desativado.”
Ele conta que tentou buscar ajuda, mas foi impedido pelos seguranças do deputado Filipe Poubel. E que o próprio deputado o xingou com ofensas homofóbicas.
“Eu lembro dele falar ‘ele voltou, deve subir, vamos atrás dele’. Quando eu subi, o Poubel ordenou os sete seguranças dele. Me seguraram, tentaram me agredir, me deram um ‘mata-leao’. Eu lembro dele dando muita ordem: ‘segura esse viadinho de merda, quer tumultuar minha casa’. Fazia muita palavras de injuria e homofobia, ele tava perto de mim. Ele e o seguranças.”
Uma outra testemunha, que também prestou depoimento, contou uma versão parecida: que se deparou com a amiga deitada num sofá, de vestido preto, perna aberta e que a calcinha dela estava para o lado. A testemunha disse não ter visto se a amiga estava suja e que, na frente dela, estavam dois funcionários da casa.
A investigação
O caso foi registrado na delegacia da mulher de Cabo Frio. O RJ2 tentou entrevistar a delegada, mas a polícia respondeu que a investigação está em sigilo. A equipe de reportagem apurou que, até esta terça-feira (6), oito pessoas haviam prestado depoimento.
Só em julho, mais de um mês depois que o registro de ocorrência foi feito, policiais estiveram na boate e apreenderam o sofá para que uma perícia fosse feita.
A vítima fez um exame toxicológico e deixou o vestido, que foi usado no dia, no Instituto Médico Legal, mas o resultado do laudos ainda não saiu.
Segundo a advogada Letícia Delmindo, a investigação não avança e a boate segue em funcionamento.
“É mais do que necessário o comparecimento de todos para auxiliar nessa investigação. Mas o cenário que aparece é outro, proprietários não aparecem em sede policial, permanecem em silêncio e quando se apresentam colocam como se a mulher fosse culpada. Não juntam as câmeras de segurança, o sofá onde foi o delito não é apresentado. E o pior: [o local] continua funcionando como se nada tivesse acontecido”, diz a advogada Letícia Delmindo.
“Além do abalo e prejuízo que eu estou tendo, ainda estou abalada. Eu quero resolver, quero a responsabilidade, a resposta.”
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Funcionários negam
O RJ2 teve acesso ao depoimento dos funcionários que foram acusados pela vítima. Um deles disse que abordou a mulher, foi correspondido e que ficou com ela por um tempo próximo ao balcão da boate.
À polícia, o funcionário negou ter tido relação sexual e disse ter sido ameaçado de morte por traficantes da comunidade onde mora caso ele tivesse “culpa no cartório”. Ele negou todas as acusações da vítima.
O outro funcionário disse que não esteve onde supostamente aconteceu o caso, no segundo andar, que não sabe quem esteve no local e que não conhece a vítima.
Capitão Diogo também prestou depoimento. Ele disse que a mulher insistiu em falar com ele, e se insinuou, dizendo que queria beijá-lo. O dono disse que foi para um dos camarotes, para evitar as investidas, e que depois disso não a viu mais. Meia hora depois, ele viu que estava acontecendo “um tumulto”.
Capitão Diogo contou que a mulher veio falar com ele novamente, dizendo estar com vergonha. O policial disse que a mulher estava consciente, que a questionou sobre o que tinha acontecido, mas que ela não falava. Ele afirmou não se lembrar se a mulher estava chorando.
O deputado Filipe Poubel já foi intimado para depor, mas não compareceu à delegacia. Ao RJ2 ele disse não ter sido notificado, mas que está disposto a falar.
O RJ2 foi atrás do deputado na Assembleia Legislativa, mas não o encontrou. Ele enviou um vídeo no qual disse que no dia da acusação a boate recebia uma festa particular, sem bilheteria e que ele estava lá para cuidar da parte administrativa. O deputado disse ainda que não foi notificado oficialmente para o depoimento e que se compromete a falar de maneira voluntária para “prestar todos os esclarecimentos possíveis”.
“Não sou homofóbico, inclusive tenho funcionários no meu gabinete que são homossexuais”, disse ela ao RJ2.
A mulher afirma que os donos do local estão se isentando da responsabilidade pelo que acontece no estabelecimento e por seus frequentadores.
“Eu nunca imaginei que isso fosse acontecer lá dentro. Eu achei que fossem se responsabilizar pela segurança de quem estava lá. Não foi isso que aconteceu, estão se isentando de responsabilidade. Os dois donos, um capitão da polícia e um deputado, eles têm conhecimento da lei. E está sendo totalmente o contrário que está acontecendo”, diz a vítima.
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