Abin rastreou cidadãos – A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) monitorou a localização de cidadãos todo país por meio de seus celulares durante os três primeiros anos do governo Bolsonaro. A informação é do jornal O Globo.
Segundo documentos obtidos pela reportagem e relatos de servidores da agência, a ferramenta utilizada sem qualquer protocolo oficial podia monitorar os passos de até 10 mil pessoas a cada 12 meses.
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Para isso, era necessário apenas digitar um número de telefone no sistema chamado “FirstMile” e acompanhar num mapa a localização aproximada do aparelho ligado àquele número que utilize as redes 2G, 3G e 4G.
A ferramenta desenvolvida pela empresa israelense Cognyte (previamente chama de Verint) rastreava os dados transferidos do celular para torres de telecomunicação.
Com base nisso, criava um histórico de deslocamentos e oferecia até mesmo a possibilidade de criar alertas em tempo real de movimentações do alvo.
Porém, a prática que pode parecer natural para um órgão de inteligência, gerou questionamento entre seus próprios integrantes, já que a agência não tem autorização legal para acessar dados privados dos cidadãos.
Foi aberta então uma investigação interna sobre se a ferramenta violava o direito à privacidade e operava fora dos parâmetros legais. Procurada pelo jornal, a Abin disse que não pode comentar por sigilo contratual.
O software foi adquirido pela Abin por R$ 5,7 milhões no fim de 2018, ainda no governo de Michel Temer, com dispensa de licitação. Já no ano seguinte, começou a ser utilizado sob o governo Bolsonaro.
A Cognyte foi representada no Brasil por Caio Cruz, filho do general Santos Cruz, ex-ministro de Bolsonaro que saiu do governo ainda em 2019. Caio não deu detalhes da contratação, alegando também sigilo contratual.
“Limbo legal”
Os membros da Abin que falaram com o Globo sob anonimato contaram que o programa era usado sem a necessidade de registrar quais pesquisas eram realizadas. Ou seja, não é possível verificar exatamente quantas pessoas e quem foi monitorado.
Além disso, eles relataram que a ferramenta chegou a ser utilizada contra os próprios funcionários do órgão, o que gerou uma polêmica interna. Foi esse episódio que levou à abertura de procedimento interno a respeito dos critérios e regularidade de sua aplicação.
Segundo um integrante do alto escalão, o software foi colocado em uso sob a justificativa de “limbo legal”, pois não há nada na legislação que explicitamente proíba o acesso a metadados de um celular.
A agência então alegava que utilizada a ferramenta em casos que envolviam “segurança de Estado” e que não havia quebra de sigilo telefônico.
Sem explicação
Na época em que utilizou a ferramenta, a Abin era chefiada por Alexandre Ramagem, hoje deputado federal, e estava subordinada ao general Augusto Heleno, que comandava o GSI (Gabinete de Segurança Institucional).
“Isso é com a Abin. Tem contrato, tem tudo. A contratação está toda regular. Se tiver algum questionamento, tem que fazer à Abin”, disse Ramagem ao ser questionado sobre o caso.
A Abin, porém, não forneceu as informações sobre o caso, nem a empresa responsável pelo programa. As duas partes alegaram sigilo contratual.
Em um registro na Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança (Abimde), a companhia israelense diz que presta serviços de inteligência como “geolocalização celular remota” e “inteligência na dark web”.
(Com informações de jornal O Globo)
(Foto: Reprodução)