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Escolas privadas e públicas reabrem em SP – Folha de S. Paulo – A volta às aulas nesta segunda-feira (2) acontecerá de forma desigual em São Paulo. Enquanto nas maiores escolas da rede particular todos os alunos que quiserem poderão frequentar as aulas presencialmente todos os dias, nas públicas haverá, em regra, revezamento.
A situação reforça as disparidades que marcam a educação na pandemia no Brasil, um dos países que teve escolas fechadas por mais tempo no mundo. Desde a chegada do coronavírus, alunos mais pobres têm tido menos acesso ao ensino remoto e menos oportunidades de voltar à sala de aula.
No momento, a frequência presencial às escolas é optativa tanto na rede pública como na particular. A Secretaria da Educação da gestão João Doria (PSDB) pretende torná-la obrigatória em setembro, a partir da avaliação do que vai ocorrer em agosto.
Mesmo quando isso ocorrer, enquanto a pandemia durar ainda haverá necessidade de distanciamento. Atualmente, a orientação da pasta é que as escolas atendam o máximo possível de estudantes, desde que respeitada a distância de um metro entre eles.
Mas, em regra, as maiores escolas da rede pública têm adotado o rodízio, com permissão de no máximo 50% dos estudantes por vez.
A Folha de S. Paulo procurou as dez unidades com mais alunos da rede estadual e da rede privada para saber como se dará o atendimento a partir da semana que vem.
Entre as particulares, oito das dez disseram que irão atender todos os dias 100% dos alunos que quiserem ir presencialmente, das quais três (Marista Arquidiocesano, Santa Cruz e Santa Maria) com um período de adaptação de até três semanas, em que haverá rodízio em parte das turmas.
As demais são Dante Alighieri, Móbile, Porto Seguro (unidade Morumbi), Agostiniano Mendel e Unasp.
Uma (Mackenzie) irá atender 90%, e outra, o Etapa, disse que ainda não havia definido o esquema até a tarde de sexta-feira (30).
Já na rede estadual, oito das dez informaram que irão fazer um rodízio em que 50% dos alunos poderão frequentar a escola a cada vez. São elas a Professor Francisco de Paula Conceição Junior, Professor Aroldo de Azevedo, Professor Orestes Rosolia, Brigadeiro Gavião Peixoto, Charles de Gaulle, General Humberto de Souza Mello, Padre Tiago Alberione e João Solimeo.
A Reverendo Erodice Pontes de Queiroz ainda não havia decidido como seria o esquema e, na Professor Marcos Antonio Costa, não foi localizado um funcionário para informar.
Na rede municipal, instrução normativa da Secretaria da Educação prevê que os alunos “serão atendidos na forma presencial e em sistema de revezamento semanal, em no máximo duas turmas”. Nas creches municipais, o limite será de 60%.
Nas escolas da rede pública que adotarão o revezamento, os alunos deverão fazer atividades remotas nos dias em que não forem à sala de aula.
Já na rede particular, se o chamado ensino híbrido (mescla de remoto com presencial) chegou a ser apontado como o futuro, há unidades que decidiram abandoná-lo de vez.
É o caso do Santa Maria, em Interlagos (zona sul). Lá as famílias terão que optar ou por ensino 100% presencial ou 100% remoto.
“Se o aluno não pode vir, é porque tem algum risco ou mora com alguém com alguma doença, por exemplo. Então ele não deveria vir nenhum dia”, justifica a diretora Diane Clay Cundiff.
Ela compara a experiência presencial e a remota à diferença entre ver um filme no cinema ou no celular. “Você pode pode até entender a história, mas não é a mesma coisa”, diz. “A aprendizagem acontece na coletividade.”
Dados de avaliação do governo estadual corroboram a deficiência do ensino remoto. Após um ano de atividades na maior parte a distância, alunos não só não avançaram como regrediram.
Para as famílias, e principalmente para as mães, a falta de um lugar para poder deixar os filhos também significa redução de renda e de oportunidades de trabalho.
“Desigualdades preexistentes alimentam desigualdades para a frente. Já existe uma diferença enorme de salário entre homens e mulheres. Quando um membro da família tem que abrir mão do trabalho para cuidar da criança, acaba sendo o que ganha menos”, diz a economista Cecilia Machado, professora da FGV e colunista da Folha de S. Paulo.
Ela aponta ainda que a qualidade da educação e as habilidades socioemocionais desenvolvidas nas interações na escola são fundamentais para a melhora da produtividade e o crescimento de longo prazo.
Professor da UFABC (Universidade Federal do ABC), Fernando Cássio critica a falta de transparência da Secretaria da Educação sobre os investimentos feitos em cada escola e sobre as consequências do retorno diante da circulação da variante delta, mais transmissível.
Para ele, o governo precisa anunciar o quanto antes políticas públicas para evitar que o estudante da rede pública seja ainda mais prejudicado pelo revezamento.
Subsecretário de Articulação Regional da secretaria estadual, Patrick Tranjan afirma que a Secretaria da Educação pretende avaliar o retorno em agosto para em setembro tornar obrigatória a presença dos alunos, seja em rodízio ou não.
O esquema de revezamento, afirma, será mantido nas unidades em que seja necessário para respeitar a distância entre os estudantes até que a área de saúde diga que a pandemia está controlada.
Tranjan ressalta ainda o programa de recuperação da pasta, com foco nos mais vulneráveis, que devem também ser priorizados no atendimento presencial. Diz também que estão sendo dadas as condições para que eles cumpram a carga remota, com a distribuição de chips de internet.
O subsecretário afirma ainda que há escolas na rede estadual que irão atender 100% dos alunos. A pasta ficou de informar à reportagem quais eram, mas não o fez até a publicação deste texto.
Já a Secretaria Municipal de Educação afirma que as escolas que tiverem condições de manter o distanciamento de um metro poderão atender 100% dos alunos. Quando houver revezamento, o aluno terá que cumprir um roteiro de estudos em casa, inclusive com aulas síncronas, e haverá esquema de recuperação.
Indefinição na maior escola estadual atrapalha mães e crianças
Na maior unidade da rede estadual na capital, a direção definiu que os alunos continuarão sendo atendidos em esquema de rodízio, com as turmas divididas em dois grupos.
Com mais de 2.300 matrículas, a escola Professor Francisco de Paula, na região do Capão Redondo, ao menos até quinta (29) não havia comunicado às famílias como será o atendimento a partir de segunda (2).
A quatro dias do início do segundo semestre letivo na rede estadual de ensino, alunos brincavam nas ruas próximas à escola sem saber como seriam as aulas nos próximos dias.
Na tarde de quinta, a faxineira Ivaneide Gomes, 47, observava o filho João Vitor, 6, jogar bola com outras crianças. Ela conversava com outras mães sobre a incerteza do retorno à escola e de como será a rotina da família nas próximas semanas.
João Vitor está matriculado no CEU Cantos do Amanhecer, no mesmo bairro, que também não informou ainda como será a frequência dos alunos.O menino costuma ficar sob os cuidados da irmã mais velha, de 14 anos, que estuda na escola Francisco de Paula.
Se os dias do revezamento das duas escolas não coincidirem, Gomes não sabe com quem o caçula passará o dia enquanto ela estiver trabalhando. “Ele é muito pequeno e apronta demais pra ficar sozinho, mas vai ser o jeito. Não tenho dinheiro pra pagar alguém pra ficar com ele e não posso prejudicar minha menina.”
Os dois filhos estão desde março sem frequentar a escola e tiveram dificuldade para acompanhar as atividades a distância, já que só há um celular na casa. Gomes queria que as aulas retomassem diariamente para retomar a rotina da família.
“Depois de mais de um ano sem escola, seria bom que a gente tivesse um tempo pra se organizar, mas não disseram nada. Não sei como vão ser as aulas. Não vejo a hora de poder retomar a rotina antiga, sabendo que as crianças vão ter aula todo dia”, diz Gomes.
Luciana Cezário, 54, também quer que o filho Caio, 16, volte para as aulas já que está há mais de um ano sem acompanhar as atividades escolares. “Briguei para que ele continuasse estudando, mas depois desisti. Não acho que ele ia aprender muito pelo celular. Quero que volte pra escola.”
No primeiro semestre letivo deste ano, a escola Professor Francisco de Paula voltou a receber os alunos, mas as turmas só podiam frequentar as aulas uma semana no mês, com 2h30 de atividades por dia. “Ninguém ia porque não dava tempo pra nada. Fui uma vez e depois desisti”, conta Caio.
A incerteza sobre como será o retorno das aulas presenciais também fez algumas famílias optarem por ainda não deixarem os filhos frequentar a escola. É o caso de Jéssica de Jesus, 30. Ela decidiu que Isabella, 11, e Eduardo, 7, vão continuar em casa nos próximos meses.
“Eu e o Eduardo temos problemas respiratórios e somos do grupo de risco. Não posso arriscar uma contaminação”, diz.
Ela conta ter conseguido manter uma rotina de estudos com as crianças, mas reconhece que eles aprenderam pouco durante a pandemia. Na 2ª série do ensino fundamental, Eduardo reconhece as letras do alfabeto e só consegue escrever o próprio nome.
“Acho que ele já deveria ter aprendido a ler e escrever mais palavras, mas não consegui ensinar mais que isso. Fico preocupada com a educação, mas não posso arriscar a saúde dele.”