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China e Taiwan – Nos últimos dias, a mídia e analistas fizeram muito alarde sobre duas questões do XX Congresso do Partido Comunista chinês: 1) a ameaça de uso da força para resolver a questão de Taiwan; 2) a reafirmação da identidade socialista. Ambas constituem absolutamente nenhuma novidade.
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A Ilha de Formosa, conhecida como Taiwan, foi ocupada pelos japoneses após o Tratado de Shimonoseki, decorrente da derrota da China na Guerra Sino-Japonesa (1894-1895). Durante a II Guerra Mundial, a Conferência de Cairo reconheceu que ela voltaria ao domínio da China.
Com a guerra civil que levou o PC ao poder em 1949, remanescentes do Kuomintang se refugiaram em Taiwan e lá mantêm até hoje as estruturas da antiga República da China, em oposição à comunista República Popular da China. Reivindicam o controle da China, não a separação desta.
Desde então, a China comunista manteve a mesma política diante de Taiwan: reconhece como um problema interno chinês, no qual terceiros não devem exercer influência e mediação, e que pode ser resolvido por via pacífica, preferencialmente, ou violenta, a depender da conjuntura.
O que mudou foi a postura dos EUA. Inicialmente, reconheceram Taiwan como parte da China. Após a vitória do PC, passaram a considerar o governo de Taiwan como legítimo. Desde a década de 1970, reconheceram a China comunista e respeitaram o princípio de “uma só China”.
O acirramento da competição internacional entre China e EUA fez com que estes aumentassem sua dubiedade diante do princípio de “uma só China”. Mas como disse Xi, a visão chinesa segue: trata-se de um assunto interno, ao qual se pode recorrer ao uso da força. Nenhuma novidade.
Quanto à reafirmação de Xi sobre a convicção socialista da República Popular da China e do Partido Comunista, nada de novo. Desde a vitória da revolução em 1949, nenhum Congresso do PC teve qualquer menção a recuos na orientação socialista e marxista-leninista do país.
Como já mencionei em outra oportunidade, mesmo no momento crucial de inflexão da China para as políticas de Reforma e Abertura, Deng Xiaoping anunciou o que considerava os “quatro princípios cardeais”, indiscutíveis, do país:
1) A defesa do caminho socialista;
2) A defesa da ditadura democrática do povo;
3) A defesa da liderança do Partido Comunista;
4) A defesa do pensamento de Mao Zedong e do marxismo-leninismo.
Quando liquidacionistas tentaram reformas políticas liberalizantes e anticomunistas em 89, o PC respondeu com tanques na Praça da Paz Celestial. Logo, tal “reafirmação” do socialismo só surpreende quem nada sabe sobre o país, ou quem insiste que a China é um país “capitalista”.
A enorme ênfase da mídia e acadêmicos ocidentais sobre esses aspectos ocorre por dois motivos: 1) a necessidade política de mostrar uma suposta radicalização das movimentações chinesas; 2) o total desconhecimento da história das políticas externa e doméstica da China comunista.
O XX Congresso do PC foi muito mais marcado por traços de continuidade do que de radicalização das tendências que vinham sendo esboçadas. Tanto a reafirmação da identidade socialista quanto a possibilidade de uso da força na questão de Taiwan já perduram HÁ MAIS DE 70 ANOS!
Por Tiago Nogara, mestre em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB), doutorando em Ciência Política pela USP, professor de Política Internacional, pesquisador associado à Universidade de Xangai.
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Este texto é opinativo e não reflete, necessariamente, a opinião do site Brasil Independente.